Mais ou menos violento, mais ou menos activo, mas há um vulcão dentro de cada um de nós, que estremece e lança fumo ou lava doce e regularmente... Ou então que parece adormecido ou extinto durante tanto tempo, para depois se revelar inesperadamente, com violência.
Tenho estado pacífica, nos meus exercícios mentais de arrumar o excesso de recordações e de peso, de transformar, como com fotoshop, as recordações más para não me sentir tão abalada quando elas emergem... Mas do nada às vezes vêm memórias e ideias... E eu verifico que a natureza doce e passiva que tenho é ainda a mesma que foi forjada durante tanto tempo, quando tinha que ouvir desculpas ridículas do meu pai para a violência que exercia sobre nós. Desculpas relacionadas com os pais, que não o amaram, os irmãos, que não o trataram bem, o trabalho, que era duro, o álcool que o escravizava, a minha mãe, por não ser melhor esposa... E eu tinha que ouvir tudo aquilo, acenar que sim, que compreendida, e garantir-lhe que sim, que eu era a amiga dele, que gostava dele e que sabia que nada daquilo era culpa dele. E por fim, tinha que dar-lhe um beijo, tentando ignorar o cheiro de suor e de álcool que o rodeava. E reforçar que sim, eu gostava dele.
Quanta pequenez eu assumia, quanta revolta silenciada.
E do nada lembrei-me disto agora. E choro aflitivamente, para libertar esta emoção, esta pena de mim. E tento pensar na forma inteligente e sã de me erguer daqui. De guardar isto numa caixa. Ou de libertar isto ao vento, como se de pó se tratasse. Como se faz para largar isto e para descolar da minha pele esta maneira de ser que responde docilmente a tudo, não de uma forma racional, não por uma decisão tomada; mas por reflexo, ou instinto. Irracional, de tao entranhado que está.