29/11/2016

O vulcão que há em nós

Mais ou menos violento, mais ou menos activo, mas há um vulcão dentro de cada um de nós, que estremece e lança fumo ou lava doce e regularmente... Ou então que parece adormecido ou extinto durante tanto tempo, para depois se revelar inesperadamente, com violência.
Tenho estado pacífica, nos meus exercícios mentais de arrumar o excesso de recordações e de peso, de transformar, como com fotoshop, as recordações más para não me sentir tão abalada quando elas emergem... Mas do nada às vezes vêm memórias e ideias... E eu verifico que a natureza doce e passiva que tenho é ainda a mesma que foi forjada durante tanto tempo, quando tinha que ouvir desculpas ridículas do meu pai para a violência que exercia sobre nós. Desculpas relacionadas com os pais, que não o amaram, os irmãos, que não o trataram bem, o trabalho, que era duro, o álcool que o escravizava, a minha mãe, por não ser melhor esposa... E eu tinha que ouvir tudo aquilo, acenar que sim, que compreendida, e garantir-lhe que sim, que eu era a amiga dele, que gostava dele e que sabia que nada daquilo era culpa dele. E por fim, tinha que dar-lhe um beijo, tentando ignorar o cheiro de suor e de álcool que o rodeava. E reforçar que sim, eu gostava dele.
Quanta pequenez eu assumia, quanta revolta silenciada.
E do nada lembrei-me disto agora. E choro aflitivamente, para libertar esta emoção, esta pena de mim. E tento pensar na forma inteligente e sã de me erguer daqui. De guardar isto numa caixa. Ou de libertar isto ao vento, como se de pó se tratasse. Como se faz para largar isto e para descolar da minha pele esta maneira de ser que responde docilmente a tudo, não de uma forma racional, não por uma decisão tomada; mas por reflexo, ou instinto. Irracional, de tao entranhado que está.

25/11/2016

"Estado de Ser"

Aprendi este conceito recentemente... num livro chamado "Como Criar um Novo Eu" que, como o nome indica, fornece esclarecimentos algo complexos acerca de como as nossas experiências e vivências e pensamentos constroem uma forma de ser com a qual somos coerentes durante a maior parte da nossa vida. O "padrão" ou sequência mental de activação de certos sentimentos ou reacções é memorizado pelo nosso cérebro e passa depois a ser automática a nossa reacção igual a estímulos semelhantes, o que equivale a dizer que todos nós desejamos uma mudança na nossa vida mas continuamos a AGIR e REAGIR e SER iguais. E todos sabemos que fazer o mesmo e esperar por resultados diferentes é algo estúpido.
"O hábito mais difícil de vencer é o hábito de sermos nós próprios". O Dr. Joe Dispenza, autor do livro, desmonta este funcionamento e dá instruções para nos ajudar a construir uma nova identidade ou personalidade ou estado de ser ou algo nesta linha.
Este tal "estado de ser", explica o livro, resulta da estabilização daquilo que pensamos (o estado de espírito) e daquilo que sentimos, a um nível mais físico. Embora existam ligeiras variações quotidianas nestes indicadores, há um padrão que nos é mais frequente, ao qual voltamos por instinto, e que nos define, como quando dizemos que, no geral, somos pessoas mais preguiçosas, ou mais teimosas, ou mais tristes, ou mais ansiosas...

Chove muito, chove excessivamente... 
Chove e de vez em quando faz um vento frio... 
Estou triste, muito triste, como se o dia fosse eu. 

Num dia no meu futuro em que chova assim também 
E eu, à janela de repente me lembre do dia de hoje, 
Pensarei eu «ah nesse tempo eu era mais feliz» 
Ou pensarei «ah, que tempo triste foi aquele»! 
Ah, meu Deus, eu que pensarei deste dia nesse dia 
E o que serei, de que forma; o que me será o passado que é hoje só presente?... 
O ar está mais desagasalhado, mais frio, mais triste 
E há uma grande dúvida de chumbo no meu coração...

Há muitos anos que conheço e gosto deste poema de Álvaro de Campos. Me identifico. Penso nas mesmas questões que ele aborda... Tenho-o escrito em vários sítios, pendurado no meu quarto.
Apercebi-me que o meu "estado de ser", aquele que quero mudar, está patente neste poema. E é por isso que hoje o poema de Álvaro de Campos vai sair do meu quarto e, espero eu, da minha vida. Vou adoptar outros. Talvez um Caeiro sereno e bucólico. Talvez um Régio revolucionário e inconformado. Ou um Torga querido e contemplativo. Não conheço muitos... mas vou estudá-los e adoptar um novo estado de ser que não seja de dúvidas, de tristezas nem de medos.

09/11/2016

A cura continua...

...devagar mas certamente. É difícil fazer a mente descansar após tantos anos com o modo "alarme" e "medo" activados. E também é difícil, ao fim de quase dez anos de fugas às situações causadoras de ansiedade, medicações a camuflar sintomas e a deixar-me sonolenta, e terapias incompletas, esquecer o medo de arriscar, retirar a pressão negativa sobre alguma fragilidade, que parece logo ser um falhanço épico enquanto a gargalhadinha desdenhosa do Universo se faz ouvir, como que a dizer "hihihi... Pensavas que estavas livre disto..."
Assim sendo, um obstáculo gigante a ultrapassar é a nossa própria descrença.

Tomo uma decisão, saio do meu caminho, da minha rotina, aceito fazer algo diferente, é mais um passo. Lá vem sempre roer-me a serenidade o medo da reacção dos que me são próximos, de que me questionem, que não compreendam, que reprovem, que julguem que esse tempo lhes é retirado directamente a eles... Quando alguma censura a esse respeito vem, o instinto é responder "não pensei, não tive essa intenção, lamento". Hoje, porque tomei uma decisão diferente do habitual, voltei a sentir aquele medo, a resposta instintiva voltou a formar-se mas foi seguida de um pensamento inovador: "estou a fazer algo porque me apeteceu. Porque me pareceu ser bom, porque será bom para mim".

Algo tão elementar como o respeito por si próprio, a aceitação de si próprio, em detrimento dos outros (que, na verdade até nem estão a ser prejudicados em nada) está a crescer em mim.