24/10/2011

Briseis à Chuva



...de camisola verde.

Como se não importasse o tempo ou o frio. Demorei os passos e deixei que a primeira chuva me apanhasse. Como sinal de boas-vindas. O ar encheu-se imediatamente daquele cheiro que todos conhecemos como "cheiro a chuva", embora os cépticos teimem "mas a chuva não tem cheiro!". O nariz gelou e os óculos ficaram cheios de gotas gordas... Não me aborreci. Era como olhar o mundo e a noite consumadamente feia por um caleidoscópio. Toda a gente fugia, de caras fustigadas pelo vento, ostentando um jornal ou simplesmente a gola do casaco contra o aguaceiro que se impunha, à força de gotas pesadas e carregadas de urgência, como se lá dos altos tivessem ouvido os gemidos da terra que crestara todo o Verão. Todos se apressavam em direcção aos umbrais protectores das portas... e eu atrasei o passo, em desafio à intempérie e ao medo dos outros. Não tive receio que me julgassem tola. Eu era Briseis à chuva... de camisola verde. E, por um momento, imaginei que o povo amedrontado abandonava os abrigos e vinha juntar-se a mim, e dar à chuva mais para molhar. Não vieram, é claro. Fui Briseis sozinha à chuva... sozinha com a minha camisola verde.

18/10/2011

"Os Três Mosqueteiros"


Em duas palavras: BRU-TAL!!!
O raio do filme está um estouro... Fui ver porque achei graça ao trailler e porque, enfim... andava por lá perdido o meu Orlando Bloom Adorado... Além disso, uns amigos tinham visto e falaram maravilhas... Normalmente, quando vou de expectativas elevadas, acabo um bocadinho desiludida, mas não desta vez!
Aquela históriazinha dos mosqueteiros que todos conhecemos está lá. Sem tirar nem pôr. O D'Artagnan que chega a Paris com o sonho dos Mosqueteiros, que no mesmo dia arranja um duelo com cada um deles, sem saber quem são, que estão reformados e desiludidos, que vem aí o Duque de Buckingham, e que a rainha tem uma certa aia, de seu nome Constance, que eu jurava que era Julieta... Mas pronto... É a história chapada. MAS É FENOMENAL! Não aborrece em momento nenhum o facto de sabermos a história porque o filme está simplesmente espectacular... A realização superou-se, tem alguns efeitos especiais que foram magnifica e discretamente usados, o guarda-roupa é estonteante, lindíssimo, mesmo! As cenas de luta são executadas com tal graça e os movimentos são espoantosos, parece um bailado... E todos os actores parecem ter nascido para representar o papel que lhes coube... Gostei tanto, tanto, que nem me importei que o meu Orlando Bloom Adorado (o Duque de Buckingham) apareça poucas vezes. ...hum, e acho que o cabelo à Buckingham lhe fica a matar... muito melhor que o loiro deslavado que usava no Senhor dos Anéis... =)
O humor é constante mas moderado, para sorrir, não rir. Enfim... nem sei que diga. Estou maravilhada... O bonitão do Matthew Macfadyen,que vimos como Prior Phillipe, nos Pilares da Terra, está muitíssimo bem aproveitado, a fazer de Athos, o amargurado, o desiludido, o charmoso... A tola da Milla Jovovich, fica muito bem de femme-fatale, embora eu tenha reparado que, apesar de magra e pálida, as mãos dela são horrorosas!lol E o famoso D'Artagnan é representado por um muito jovem Logan Lerman, de quem nunca tinha ouvido falar mas que vou ver se mantenho debaixo de olho... =)
Enfim, caras larocas à parte, está um grande, GRANDE filme. Recomendadíssimo!

16/10/2011

Hoje estou para a estupidez...

...e para a lamechice... e para o amor e uma cabana.

É que, ligo a TV de manhã, enquanto tomo o meu pequeno pequeno-almoço (uma torradinha e o copinho de leite com café) e levo logo com as notícias das detenções e estragos causados pelas manifestações de ontem, em Lisboa e noutras cidades do mundo... Isto perturba-me e deprime-me. Mais do que ameaças de austeridade e números assustadores que não compreendo, assusta-me ver as pessoas aos magotes, revoltadas e impacientes, que gritam e insultam com caras distorcidas pelo cansaço... Fiquei verdadeiramente perturbada ao ver isto e formou-se-me um nó na garganta que impediu a passagem fácil da minha torradinha...

E depois, vindo do nada, soa-me na memória o "só nós dois é que sabemos..." cantado pelo Tiago Bettencourt, esse geniozinho adorável! E o pensamento que me fica na cabeça a partir desse momento é (vejam lá se há coisa mais pindérica): pessoas que saibam viver assim, não sentem a crise, não sentem o medo, não se importam que vidros partam e carros ardam... e também queroooo!!!



Só nós dois é que sabemos o quanto nos queremos bem
Só nós dois é que sabemos, só nós dois e mais ninguém
Só nós dois compreendemos este amor triste e profundo
Quando o amor acontece não pede licença ao mundo
Anda, abraça-me... beija-me. Encosta o teu peito ao meu
Esquece o que vai na rua
Vem ser minha, eu serei teu
Que falem não nos interessa, o mundo não nos importa
O nosso mundo começa dentro da nossa porta

Só nós dois compreendemos o calor dos nossos beijos
Só nós dois é que sofremos as torturas e os desejos
Vamos viver o presente tal qual a vida nos dá
O que reserva o futuro, só deus sabe o que será
Anda, abraça-me... beija-me. Encosta o teu peito ao meu
Esquece o que vai na rua
Vem ser minha, eu serei teu
Que falem não nos interessa, o mundo não nos importa
O nosso mundo começa dentro da nossa porta

13/10/2011

Visita à Invicta

Mal entrei no comboio, deu-me vontade de escrever. Não tinha o computador comigo. Nem sequer um mísero bloco... Então agarrei em alguns talões do multibanco que, dadas as circunstâncias, teriam que servir...


Estações de Comboio são lugares admiráveis. É sempre comovente ver os que partem serem acompanhados pelos que ficam. Tristeza de uns, saudade de outros. Ou então alegria e inveja, respectivamente. Os momentos antes da chegado do comboio, de excitação. O ar que se respira frio e novo. Depois, o embarque, a confusão. Tomados os lugares, o clímax: o acenar, os últimos sorrisos atirados. Mulheres que acenam aos maridos, jovens militares que se despedem das namoradas como se estivessem prestes a embarcar para África, novamente. E, depois, o momento em que a carruagem arranca, invertendo tudo: um momento de protagonismo na linha central da estação, por um comboio anónimo a circular num linha perdida no meio de nenhures. E as pessoas, amadas e olhadas com olhares amantes lá de fora, de repente convertem-se em estranhos partilhando a mesma carruagem e o mesmo ar.
Era aquele o momento que mais me doía e prolongava-se um pouco, enquanto o comboio percorria a cidade. E depois afastava-se. Até que, numa curva do monte, deixava de se ver completamente. Aí era o vazio. Só o rio permanecia visível. O rio que era como um fio que eu sabia que ia dar à minha terra. À minha casa.


Este post é para a Quelinha; motivo da minha visita e companhia em tantas viagens iguais.


Texto original postado a 10 de Março de 2010, repostado para a Fábrica de Letras, tema do mês de Outubro: Viagens.

10/10/2011

Who's been a bad, BAD girl?

I have!


Sabem o que é delicioso? Mostrar as garras a quem nos ensinou que as tínhamos.

Sabem porque é que os animais criados em cativeiro se tornam uma ameaça para o tratador, mais cedo ou mais tarde? Sim, há a treta do instinto e tal... mas tambem é porque é irresistível mostrar o nosso poder a quem no-lo ensinou, numa de "o aprendiz superou o mestre".

É uma vertigem, um capricho, ser deliberadamente cruel com quem tantas vezes lamentou eu ser demasiado condescendente e permissiva com os outros. É delicioso.

07/10/2011

Não. Não... Não!!

Ando com os meus fantasmas, eles seguem-me. Conto os passos até casa. O sol vai à frente, a indicar o caminho e a provocar-me os olhos. Baixo negligentemente a cabeça, como se de um transeunte indesejado se tratasse. E avanço em passos rápidos. Para chegar a casa, rápido, rápido. Não, hoje não estou com medo. Hoje estou simplesmente desagradada. Estou tolerância zero para conversa da treta, para ouvir falar mal de quem quer que seja, para estupidez crónica, para amuos mesquinhos. Não me apetece teatro, não me apetece ser compreensiva: balbucio uma desculpa (ou então nem me dou a esse trabalho), ocupadíssima!, e zarpo para outra freguesia. "Não queiras saber de mim, esta noite não estou cá..."
Chego a casa satisfeita e descanso. Não me apetece gente, não me apetece futilidades, hoje estou importante, não quero saber das tuas teorias sobre lâmpadas fundidas, não me enerves com os teus caprichos mesquinhos e problemas de integração mal resolvidos, não me vou dar ao trabalho de te contrariar hoje, a tua voz irrita-me. Não me interessais, hoje.

Hoje sou senhora do meu nariz e o meu sorriso não está ao preço da chuva, como estais habituados a pensar. Hoje estou, verdadeiramente, num pedestal. Não porque tenha lá subido, mas porque o resto do mundo, e vós lá incluídos, desceu de nível a meus olhos...

04/10/2011

"Meia-noite em Paris"



Antes de mais nada: três vivas para o Owen Wilson que é um tipo extraordinário, admirável, com uma figura super amável, uma carreira muito coerente e constante... e pronto. Gosto do gajo. Até do nariz...
Owen, ma good fellow: "Hip-hip-hip...hurrey" para ti!







Agora acerca do filme... É maravilhoso! Adorável... muito tocante, profundo e comovente, ao contrário do que o título do filme possa sugerir.
Não sei criticar filmes tão fluentemente como o faço com os livros, mas este tocou-me imenso e poderia revê-lo uma e outra vez porque tenho a certeza que encontraria sempre algo de novo: algum pormenor, uma frase, uma lição, um detalhe deliciosamente insignificante que enche de riqueza este filme tão simples e belo, mas de uma simplicidade e beleza enganadoras, cheias de carga simbólica.
Como lado negativo, que não o é verdadeiramente, está o facto de exigir uma certa "bagagem cultural", nomeadamente no que diz respeito a pintores e escritores dos anos 20. Adolescentes como a minha mana, que nunca ouviram falar em Hemingway, Cole Porter, T.S. Eliot ou Dalí, vão passar o filme sem entender peva... Portantos, o meu humilde conselho é: dêem uma ensaboadela na vossa cultura dos anos 20 porque vai ajudar a desfrutar muito mais do filme.
E é um belo filme! Um tesourinho, deveras!

02/10/2011

"As Quatro Últimas Coisas", de Paul Hoffman


O tão aguardado!!!
É o segundo capítulo da Trilogia "O Santuário dos Redentores", sendo o primeiro capítulo "O Braço Esquerdo de Deus", do qual aqui muito entusiasticamente falei...

Esta continuação é menos negra do que o final da primeira parte fazia prever. Fez-me lembrar as sequelas daqueles filmes estilo "MATRIX" ou "Resident Evil", em que o primeiro nos deixa maravilhados e o segundo desiludidos... porque complica e revela lados menos explorados de certos locais, enredos e personagens... E quase sempre isso se revela mais enfadonho do que no primeiro capítulo, que é todo deslumbramento e descoberta... De modos que foi um tudo-nada mais pobre do que aquilo que estava à espera. Além de que vemos algumas das personagens em situações que, por aquilo que sabemos delas da leitura anterior, são um bocado estranhas e inesperadas.

A honra do convento salvou-se porque Thomas Cale continua uma personagem fascinante, com um lado deliciosamente negro e cruel, muito retorcido e maltratado... e também porque a história, à semelhança do que aconteceu no primeiro volume, intensifica-se nos últimos capítulos e, graças ao Redentor Enforcado! (private joke...), faz lembrar o que tanto nos cativou n'O Braço Esquerdo de Deus... De modos que, apesar de ter sido uma leitura aquém daquilo que esperava, eis-me novamente desejosa de pôr as garras na terceira e (espero!) última parte da história!