22/01/2016

Pessoas extraordinárias - a dona Fátima

Há pessoas extraordinárias. Em todo o lado. Cruzamo-nos com elas todos os dias sem as vermos, até chegar o dia em que, sem motivo aparente, poisamos o olhar com um pouco mais de cuidado e tempo. Acontece-me muitas vezes. Hoje aconteceu com a dona Fátima e, pela primeira vez, resolvi escrever sobre isso.

A dona Fátima é a florista da rua aqui de trás. Não tão sofisticada como outras, mais procuradas (e careiras também). Mas tem gestos carinhosos com as flores, ajeita-as como uma mãe ajeita um caracol rebelde na cabeça do filho. Nas datas festivas em que toda a gente corre às floristas, ela costuma ainda ter belas flores, quando as outras já só têm refugo, e é por isso que gosto de lá ir. Quando vou buscar um raminho para oferecer à minha mãe pelo aniversário, ela escolhe uma plantinha florida e manda-me entregá-la à aniversariante com um beijinho da parte dela.
Quando lá vou buscar flores para velórios, discretamente e com sensibilidade, tenta saber pormenores das minha relação com a pessoa falecida para me aconselhar um ramo mais discreto ou uma palma solene.
Hoje passei à porta da sua lojinha, sempre atafulhada de plantas, vasos, flores... Só deixa livre um corredorzinho que liga a direito a porta ao balcão, muito poucos adornos além das próprias flores e a tinta das paredes já a querer descascar... Mas hoje não! Hoje, no dia cinzento e naquela rua de comércio tradicional que se vai deprimindo a olhos vistos, ficando cinzenta também, vinha uma luz clara do interior da montra da dona Fátima e, no lado de fora, homens penduravam um novo letreiro, bonito, alegre. No interior, vazio e mais amplo do que nunca, com uma nova pintura e novos detalhes, a dona Fátima estava muito compenetrada a fazer alguma coisa que não consegui identificar... Mas fiquei feliz por ela, por dar um novo ar ao seu negócio de cores e perfumes e àquela velhinha rua.

20/01/2016

Queria muito que o meu blog fosse mais como aqueles que eu própria sigo e leio... Que fosse inspirador, que falasse das coisas boa da vida, que mostrasse bonitas imagens, ou contasse histórias que merecem ser ouvidas/lidas. Mas acho que o meu blog se foi aos poucos tornando num refúgio onde escrevo os meus medos, angústias e ansiedades. Não o faço com aquela ideia de ajudar quem possa estar a passar pelo mesmo... Não sou assim tão altruísta. Faço-o como desabafo, e porque recolho também alguma serenidade dos vossos comentários... E, pensando um pouco no assunto, com a esperança de ajudar, não quem sofre também do distúrbio de ansiedade generalizada, mas as pessoas que com elas lidam. Porque ao sofrimento pessoal que a ansiedade traz, junta-se o também grande sofrimento por ser quase impossível explicar ou justificar aquilo que a pessoa ansiosa sente. Eu expresso-me com muitas palavras, gosto e preciso de falar de tudo e acontece-me às vezes estar a descrever alguma sensação ou estado de espírito e quem me ouve interromper-me para dizer "é exactamente isso que sinto também!". É essa a minha esperança, que mais pessoas compreendam como é fácil e frequente despoletar um estado de ansiedade, e como ele se propaga pelo corpo, controlando tudo e tornando ameaçadoras até as coisas que conhecemos desde sempre.

Nestes momentos questiono-me acerca do valor da palavra perseverança. Porque só é perseverar se insistirmos em algo que nos desafia e assusta e no final der certo. Quando é que a perseverança passa a cobardia? Cobardia por não se saber ou querer admitir que é altura de tomar um novo rumo, virar uma nova página, dar um passo atrás para podermos depois dar dois em frente. Se der certo, foi bom termos perseverado. Se der errado, ao fim de todo aquele tempo de luta e de tentativas, vai ser chamado de cobardia, porque não se teve a coragem de cortar o mal pela raiz mais cedo.
Se ao menos pudéssemos ver adiante... Se pudéssemos saber se estamos a lutar por algo que vale a pena... Neste momento eu choro por não saber o que fazer...

17/01/2016

Percebo que sou anti-social quando...

...reparo que trabalho melhor quando estou rodeada de pessoas. O resto das pessoas precisa estar só para se concentrar e, rodeados de gente, tendem a conversar e distrair-se. Eu, se estiver só, derivo, vou pelas internetes procurar assuntos de interesse ou joguinhos. Com pessoas por perto, concentro-me no trabalho, porque não me interessa participar...

16/01/2016

A nossa mente é o que temos de mais poderoso. E digo isto mesmo num sentido anatómico. Não que a localização da mente se possa apontar num esquema do corpo humano, mas tirando esse pormenor, ela sobrepõe-se à resistência de um músculo ou à dureza de um osso.
Eu tenho alimentado a minha mente com coisas algo negativas, com tristezas e medos, e a minha mente transformou-se numa máquina automática que debita dúvidas, lembranças tristes e previsões azarentas numa fracção de segundo e sem ser preciso muito estímulo. A minha mente despoleta mal-estar físico, tremuras, dor no peito e barriga, vómitos. A forma como a minha mente está formatada faz-me interpretar as coisas de forma muito intensa, exagerada, fatalista. Posso, sem medo de estar a exagerar, afirmar que nos últimos anos praticamente não tive problemas de saúde além dos que tiveram origem na minha mente, na minha ansiedade.
E isto faz-me chegar à conclusão frustrante de que, se a mente tem o poder de nos dar uma dor física, se nós a conseguíssemos dominar ou conduzir por um caminho mais positivo e construtivo, que coisas grandiosas conseguiríamos fazer! Até faríamos as coisas levitar!!

12/01/2016

Sobre a morte de David Bowie

Que aliviada fiquei ao reflectir sobre o assunto e constatar que David Bowie nunca fez parte do meu universo musical. Sou do glorioso ano de 86 mas já os anos 90 iam bem adiantados e eu continuava a ouvir cá por casa os êxitos dos anos 70 e 80, porque o meu pai ficou parado nesse tempo. Isso deu-me um gosto e conhecimento geral dos grandes nomes desses tempos, não muito partilhado pela minha geração, mais virada para os sucessos seus contemporâneos. Mas David Bowie não era nome que constasse das k7's cá de casa e, por isso, o meu conhecimento dele limita-se a "Heroes" e "Let's Dance", das quais nunca gostei por aí além... E a sua participação em "Under Pressure", dos queridos Queen.
Fico, assim, feliz por não ter sentido o golpe e pesar que vi em outras pessoas ao saber da morte do "camaleão". Perdoem o cinismo da observação, mas fez-me pensar que, tal como com tantas outras coisas e pessoas, mais vale não saber, não gostar, não conhecer, e ser poupado ao sofrimento de perder...
Mas vai daí, talvez não. Talvez o ter conhecido e aproveitado seja melhor do que o espaço cinzento da ignorância.