13/06/2011

Fight Club

Na véspera, já só consigo pensar nisso... Que está quase! Stress acumulado, frustrações engolidas, ultrajes suportados... tudo ficará sanado em meia dúzia de golpes enraivecidos.


No Dia D, visualizo e anoto mentalmente motivos e pretextos. Devem ser todos bem insuflados para que nenhum atentado ou nódoa fique sem resposta e para que não me falte a convicção, a força e a raiva em algum dos assaltos. Tudo devidamente avivado e catalogado, começo a preparação. A adrenalina já sobe e as mãos tremem-me enquanto aperto com força os atacadores das sapatilhas. A roupa é confortável, sempre. E larga, solta. Para que não prenda ou refreie os movimentos.
Parto confiante e feliz e vou ganhando confiança e estatura à medida que avanço. Mal posso esperar por ouvir o primeiro toque do gongo. O começo é sempre moderado, um aquecimento, uma habituação aos movimentos pouco costumados. Estico o braço direito, punho bem cerrado, nós dos dedos cortando o ar, o tronco acompanhando o movimento do braço para dar mais intenção ao golpe. Preparo uma série de joelhos aguçados e termino com pontapés bem lançados.
Diante dos meus olhos desfilam rostos, ora sorridentes, ora amolgados pela força vingadora da minha sapatilha. Viro-me, troco de perna e recomeço. Ouço as vozes dos que me atacaram e abafo-as com os meus gritos de guerra, dignos dos filmes do Van Damme.
O ar, pobre dele, não me responde e é por isso que, com meia dúzia de golpes e Yahhhhhhhs! eu consigo sentir-me quite com o mundo e com os outros. A sala está cheia de gente que, apesar de concentrada no mesmo que eu e repetindo os mesmos golpes, está imersa num mundo só seu, a curar os seus próprios rancores.
O Body Combat é isso. Uma espécie de Fight Club onde todos se respeitam demasiado para se agredir entre si. Em vez disso, vamos golpeando o vazio à nossa volta, preenchido por cada um ao sabor da sua raiva. Os espelhos vão embaciando, como se a ira se evaporasse directamente pelos poros e se fosse colar ali, visível e apaziguadora.
Chegádos cá fora, ninguém suspeita o ritual que levámos a cabo. É doloroso e cansativo, mas essencial. Terapêutico. Porque não podemos agredir, esbofetear e pontapear abertamente o pessoal que por aí anda, mesmo que mereçam. Aquela sala é confessionário e sanatório, onde descarregamos sem o risco de que outro punho venha desenfreado em direcção às nossas caras larocas.
Para a Fábrica de Letras, mês de Junho - "Os Problemas Resolvem-se à Chapada"

7 comentários:

  1. Deve ser uma excelente terapia, ainda não experimentei mas despertou a minha curiosidade.
    Excelente participação como sempre aliás.

    Beijinhos

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  2. Fê, é fantástico... Eu já não quero outra coisa... Yogas e pilates não são para mim. Eu tenho que extravazar... lol
    Beijinho

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  3. Entendo muito bem o que escreveste.
    O tatami também é o meu chão sagrado... respeito pelo adversário acima de todas as técnicas de defesa e ataque. Revigoro o corpo e a mente. A aparente violência fica no dojo, cá fora, estamos mais atentas e temos uma responsabilidade cívica acrescida.

    E por acaso também temos o jogo da chapada que serve para testar os reflexos :)))

    Bjs

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  4. MZ, nunca tinha ouvido falar no jogo da chapada... mas o nome e a ideia agradam-me... =)
    Ainda bem que encontrámos estes escapes para o que nos é tóxico... Somos mais sãs, assim.

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  5. Olá,
    Não conhecia o descrito...
    Não dá pra mim... Adrenalina só na aula de aeróbica...
    Abraços fraternos de paz

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  6. Orvalho do Céu, há videos na net... Basicamente é uma coreografia de passos e golpes de várias artes marciais e de luta, tipo boxe e muai tai... Aeróbica é divertido mas para adrenalina não há como combat! =)

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  7. Já tanta gente me falou das maravilhas do Body Combat mas ainda ninguém me tinha deixado com uma pitada que fosse de vontade de o praticar... Acho que acabaste de mudar isso :) Embora eu goste mais de desportos de grupo, esta parece-me uma modalidade em que nós somos o centro, e é sobretudo para nós :)
    Também fiquei com vontade de voltar a escrever para a Fábrica de Letras, e foi através da FL que vim aqui parar!

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