Para aproveitar a folga e o sol, fui a meio da tarde plantar o meu carrito na marginal, de portas abertas, para arejar, e deixei-me ficar lá perto, a vigiar e a ler o meu livro. Normalmente, sento-me de frente para o rio, indiferente a quem passa, mas hoje, por uma questão de manter o carro no meu campo de visão, virei costas ao cais e sentei-me virada para a estrada. Inevitavelmente, dei por mim perdida na observação dos que passavam, de carro ou a pé... Senhoras de idade, que caminhavam aos pares ou em trios, vagarosamente, e jovens casais vestidos desta maneira destrambelhada que se vê agora, em que parecem todos rappers ou criminosos, e elas vampiras esqueléticas e de caras apáticas... Ouvi fragmentos de conversas, ora relatos de casos quotidianos, ora lamentações, ora vozes enraivecidas...
Observar os carros também se revelou um exercício interessante... Como sempre, há os que vão bem acima do limite de velocidade, que é 50... Dentro do carro, o próprio condutor inclinado para a frente, sobre o volante, como se assim pudesse andar ainda mais depressa... Mas há aqueles carros que passam a velocidade moderada, os condutores reclinados no banco, alguns sorriem, talvez de algo que vão a ouvir no rádio, outros vão com uma cara tao inexpressiva que revela logo que vão a conduzir maquinalmente enquanto a cabeça está noutro sítio...
Relaxou-me, este exercício de observar os outros. Durante aqueles minutos, eu fui apenas expectadora... Passou por mim a correr um velho conhecido e até me soou estranho o timbre da minha voz, quando o cumprimentei, de tao imersa que estava na passividade da observação da azáfama alheia. Estava a imaginar para onde iria aquele homem a tão grande velocidade; que actividade seria a daquela empresa cujo nome eu desconhecia e que li escrito na lateral de uma carrinha; que confortável deveria ser a atmosfera dentro daquele carrão sofisticado que passou a velocidade de cruzeiro... Fiquei nestes pensamentos algum tempo, subitamente consciente da vida e da história que toda aquela gente carrega...
É-me mais fácil respirar quando me apercebo que sou só um grão de areia na imensidão do areal. Sentimentos de que sou notada, ou esperada, fazem-me alterar a respiração.
Um exercício mental que acaba por ser relaxante!
ResponderEliminarBom fim de semana.
Olá, Briseis.
ResponderEliminarTambém eu, muitas vezes, pego-me a fazer esse exercício de observação que é mais forte do que eu e minha vontade. Observo, observo pessoas e a própria natureza, nos seus afazeres tão próprios e sinto-me tão grão de areia! Como a entendo ;)
abç